9 de mar. de 2020

O caso do “Barriga-verde”


O caso do “Barriga-verde”

Define o Sr. Cândido de Figueiredo Barriga-verde do seguinte modo: "Designação depreciativa dos habitantes do Estado de Santa Catarina, Catarinense".

Tenha paciência o ilustre filólogo, mas sou forçado a opor-lhe formais embargos, afirmando-lhe que provavelmente algum mal informado o induziu a grave erro.

Na minha qualidade de barriga-verde, tenho muita honra e prazer em o lembrar, arvoro-me em procurador de meus coestaduanos para refutar a inverdade publicada pelo Sr. Cândido de Figueiredo. Não posso deixar passar o ensejo desta retificação.

Barriga-verde, quem o ignora? é tão depreciativo quanto capixaba para o espírito-santense, carioca para os filhos da muito heroica e leal cidade sebastianense, guasca para os rio-grandenses, paraoara para os belenenses da velha estirpe. Pois se é até alcunha amistosa, nascida da recordação honrosa dos feitos de um regimento tradicional de Santa Catarina, organizado em princípios do século XVIII e em cuja farda figurava vistoso colete verde!

À história deste corpo se filia uma das belas passagens do anedotário dos fastos militares brasileiros: o episódio do alferes José da Silva que, arrancando da haste a bandeira do regimento, enrolou-a no ventre e, mil vezes  arriscando a vida, nadou da ilha de Santa Catarina ao continente, para impedir que o estandarte dos Barrigas-verdes caísse em poder dos espanhóis, por ocasião da capitulação vergonhosa da praça, em 1777, quando Furtado de Mendonça se rendeu, sem resistência, a D. Pedro de Ceballos.

Barriga-verde é até tratamento carinhoso entre catarinense ou catarinetas, outra alcunha amistosa.

Como houvesse eu nascido em Santa Catarina, quando meu Pai presidia a Província, alguns amigos seus, amistosa e pilhericamente, chamavam-me "infante barriga-verde". E isto fazia sorrir o progenitor do pequeno barriga-verde.

Muito embora as circunstâncias da vida me hajam feito sempre viver fora do meu Estado natal, estou certíssimo e afianço até que nenhum dos meus patrícios e sente ofendido ao se ouvir chamar Barriga-verde.  Pelo contrário...


AFONSO D'ESCRAGNOLLE TAUNAY

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